
''Paris não é mais a mesma. O ar mudou, o clima mudou, e mais alguma coisa que eu não sei o quê. As pessoas mudaram, talvez. Ou eu mesma que mudei, é provável, sou tão inconstante.
Mas é como se eu andasse por ruas e ruas, e nenhum rosto mais me fosse real. Todos rostos de pessoas que eu não sei quem são, pessoas frias, frias. E tão fúteis que me dão náuseas. A verdade é que me cansei de viver nessa cidade que de cor-de-rosa só existe na nossa fantasia. Na verdade, existia sim, não vou ser hipócrita de falar que nunca existiu um quê de diferente nessa cidade. Mas mudou. Assim como àquelas pessoas que dizem que ficam e elas vão. Não adianta, elas vão mesmo.
Eu sei que sempre que pensamos em Paris, sempre que a citamos, pensamentos bons vem à tona, imagens bonitas de uma torre Eiffel idealizada cheia de paixões, amores correspondidos e todas essas coisas cheias de purpurina que brilham e ofuscam a visão dos olhos alheios. Cansa ver essa felicidade toda explodindo de cada esquina, sendo que no fundo mesmo, o rio Senna está poluído. É a cidade da arte, do cinema. Dá-se uma pincelada nas partes estragadas e tudo vira um arco-iris de felicidade. Coloca-se uma máscara qualquer achada em qualquer lata de lixo de um beco sem saída e finge-se: está tudo bem.
As pessoas sorriem e tomam seu cafezinho, conversam e comem macarrones de diversas cores. Conversas tolas qualquer, matando o tempo. Encenando uma paisagem de uma cidade maravilhosa que só existe em nossas memórias tolas e fulas. Nem memórias mais. Paris mudou completamente. Agora é uma cidade encenada, uma cidade com outros ares, outras pessoas, que não somos mais nós. Roubaram-a de nós e a fizeram de um palco de encenações com pessoas igualmente teatrais que insistem ser quem não são, falar frases que não são suas e declarações sem emoção.
Paris, eu realmente te desconheço. Você com todas essas pessoas se tornou farsa, se tornou algo que eu não quero mais me espelhar, algo que eu não quero mais conhecer. Você com toda essa sua beleza que é de deixar tonto à qualquer um, se tornou tão feia e suja por dentro, que eu sinceramente não sei mais se você merece toda essa glamorosidade que as pessoas te dão.
Mas não me leve a mal Paris, não vou descer a lenha em você apenas. Não sou de todo mal assim. Só queria te dizer, que a sinto diferente, não a vejo mais com a mesma graciosidade de outrora. E por mais que eu tenha dito tudo isso sobre sua 'pessoa', tenho que admitir que apesar de tudo, você é encantadoramente linda. E que eu sou perdidamente apaixonada por você. Você com todas essas impurezas e farsas. Você com todos esses macarrones e cafezinhos de esquinas. E apesar de tudo, obrigada por existir.''


